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Mais ameaçado do país, bioma Pampa corre risco com o avanço do ‘PL da Devastação’

Para o Rio Grande do Sul, onde está o ameaçado bioma Pampa, com campos e banhados ricos em biodiversidade, o projeto de lei 2.159 de 2021, apelidado de “PL da Devastação“, agrava a situação. Especialistas apontam entre os riscos a flexibilização do licenciamento ambiental trazido pela proposta.

 

O PL foi aprovado no Senado em maio e enviado à Câmara dos Deputados. A relatora, senadora Tereza Cristina (PP/RS), defendeu a aprovação para destravar obras e empreendimentos no Brasil. Já setores ambientalistas criticam que a medida esvazia a atuação de órgãos de controle em projetos que podem causar danos ao meio ambiente.

 

Muito do que está sendo discutido em âmbito nacional com esse PL já é uma realidade no Rio Grande do Sul. Em 2019, sob críticas de setores ambientalistas, o governo Eduardo Leite (PSD) alterou quase 500 artigos do código ambiental do estado, que era fruto de amplo debate com a sociedade.

Pesquisadora e servidora aposentada da Fundação Estadual de Proteção Ambiental (Fepam) e da Fundação Zoobotânica, a bióloga Luiza Chomenko destaca que o projeto discutido no Congresso Nacional “se inspira, infelizmente,” no enfraquecimento das normas de licenciamento ambiental aprovadas no Rio Grande do Sul.

“Isso é, como se diz, dar o galinheiro para as raposas ficar cuidando. Nós temos artigos que liberam de licenciamento atividades que hoje são fundamentais. Então não precisa mais, você vai fazer um auto-licenciamento. Aliás, algumas na área agropecuária não vão precisar nem licenciar, são isentas de licenciamento”, alerta.

Confira a reportagem em vídeo:

 

Especialista em bioma no Pampa, que no Brasil só existe no Rio Grande do Sul, Chomenko chama a atenção para diversos prejuízos da proposta. Entre elas a possibilidade do país “entrar numa guerra fiscal” para atrair projetos. “Óbvio que eu vou dizer: no meu estado eu vou te conceder o benefício para isso. Tu vai conceder uma licença A, B ou C. Por isso que eu digo, aqui no Pampa, então, vai correr frouxa as licenças aqui no nosso estado.”

A pesquisadora alerta que as características campestres do bioma dificultam a conservação e abrem espaço para um avanço ainda maior da monoculturas ou de atividades de mineração. “Não é uma característica do bioma Pampa a ocorrência de matas e, no imaginário popular, as pessoas sempre associam que se tem árvore é importante para o meio ambiente, se não tem árvore, e eu já cansei de ouvir, é um vazio ecológico.”

“Desrespeito a uma construção de décadas da sociedade”

Pioneira da luta ambiental no país, Associação Gaúcha de Proteção ao Ambiente Natural (Agapan), entende que se o projeto passar, iniciará uma onda de desproteção em legislações regionais. O presidente da organização, Heverton Lacerda, reforça os riscos ao Pampa, que já é “bastante fragilizado, com muita vegetação nativa suprimida, com avanço de monoculturas de soja, de eucalipto”.

Segundo ele, o PL se soma à desproteção que o próprio código estadual de meio ambiente já trouxe e a outras leis que estão sendo apresentadas na Assembleia Legislativa do RS. “Com a alteração nesse código, vai para um outro nível, porque daí a nossa legislação ambiental e estadual ganha espaço para crescer na desproteção, infelizmente, porque quanto mais flexibiliza a lei nacional, aqui no estado pode flexibilizar mais, e com isso nos municípios também.”

Para Lacerda, o PL quer mudar uma legislação criada de forma democrática ao longo de décadas de debates com diversos setores da sociedade. “Esse projeto atropelado do jeito que ele vem, ele é um desrespeito a toda uma construção de décadas da sociedade que começa querendo criar a lei, criar na nossa legislação uma forma de proteger o meio ambiente. Nós, da Agapan, e as entidades que participam da Assembleia Permanente de Entidades Ambientais aqui do Estado do Rio Grande do Sul (Apedema), vemos com muita preocupação.”

Tentativa de avanço do poder corporativo

A Amigas da Terra Brasil também denuncia os prejuízos da proposta. Integrante da organização, Fernando Campos considera que o PL é uma tentativa de avanço de setores econômicos que não se interessam em desenvolver o país e cuidar do meio ambiente. “Esse projeto entra num tensionamento político nacional, faz parte de uma ação do negacionismo, principalmente dos setores mais ‘ogro’ do processo produtivo.” 

A crítica é com os setores que querem “tirar até o último suco” e não estão preocupados em desenvolver o país, que ele aponta como “negacionistas” com o que está acontecendo no planeta. Para ele, é uma “queda de braço político nacional” dos interesses “de setores corporativos, principalmente do agro, da mineração que têm feito um lobby muito intenso”.

Campos destaca que “o poder corporativo vem cada vez mais ampliando os seus tentáculos na sociedade” e que hoje “praticamente toma controle do Estado brasileiro, fazendo pressões que muitas vezes o Estado não consegue fazer frente, não consegue contrapor por conta da dependência econômica”.

Ele avalia que qualquer proposta do projeto que avance “vai ser uma derrota para os territórios, para as comunidades, para quem está no campo, para todo mundo que precisa de um ambiente saudável”.

Pampa sob risco de extinção

Para Luiza Chomemko, o PL mostra que parte da classe política e o setor econômico primário seguem não dando ouvidos aos alertas trazidos pela tragédias climáticas. “Já é cientificamente comprovado que o Rio Grande do Sul é uma das áreas que, em termos de mudanças climáticas, é dos que vai sofrer mais efeitos.”

A pesquisadora levanta um questionamento e aponta perspectivas negativas. “Resta saber até quando esse mundo vai nos suportar. Eu acho que não muito tempo. E o Pampa, da forma que está, nós corremos o risco de devastação total, de sumir. Quando eu digo, o pessoal sabe que é muito categórico, o Pampa está em extinção.”

 

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