A Justiça deu cinco dias corridos para a Prefeitura de São Paulo (SP) explicar o modelo de concessão da gestão de três escolas de ensino fundamental, as chamadas Emefs, à iniciativa privada, na última terça-feira (17). Assim, a gestão de Ricardo Nunes (MDB) deve enviar as explicações até este domingo (22).
Segundo o secretário municipal de Educação, Fernando Padula, o modelo será iniciado neste ano a partir de três escolas que ainda estão em construção nos bairros do Campo Limpo, Pirituba/Jaraguá e Santo Amaro. O plano inicial da gestão era selecionar as 50 escolas com os desempenhos mais baixos.
A determinação da juíza Simone Gomes Rodrigues Casoretti, da 9ª Vara de Fazenda Pública, foi provocada por uma ação popular ajuizada pela Bancada Feminista do Psol da Câmara Municipal. A sigla pediu que a Justiça suspenda qualquer tentativa de concessão de escolas públicas à iniciativa privada até que o Ministério Público finalize a investigação sobre o caso.
Sílvia Ferraro, covereadora da Bancada Feminista, afirmou que é papel da Câmara “impedir que a Prefeitura avance com a tentativa de privatização da rede municipal de ensino fundamental e médio. A decisão do TJ demonstra a gravidade do plano em curso e garante a devida importância ao assunto. É urgente ter uma medida para que o direito constitucional seja respeitado”.
O que foi anunciado até agora?
A concessão deve ser do tipo “porteira fechada”: a prefeitura repassa uma quantidade de dinheiro para uma entidade sem fins lucrativos, que assume a administração completa das unidades, incluindo manutenção dos prédios e contratação de professores. Somente uniformes, material escolar e didático, matrículas e diretrizes educacionais permanecerão sob a gestão municipal.
O formato é o mesmo já adotado em hospitais, Unidades Básicas de Saúde (UBSs), Assistência Médica Ambulatorial (AMA) e creches, onde uma Organização Social administra os equipamentos públicos.
“A fila quem define é a prefeitura por georreferenciamento. Não pode cobrar desses estudantes. Não pode selecionar aluno. Uniforme da prefeitura, material da prefeitura”, afirmou o secretário da Educação em entrevista à CBN.
“Nós vamos soltar um chamamento público. Nós temos três escolas em construção na cidade de São Paulo e para essas três que estão em construção, ou seja, hoje não são colégios, pensamos em um modelo de parceria com instituições sem fins lucrativos e que já atuam como colégios há muitos anos na cidade de São Paulo”, completou.
O projeto ocorreu após a prefeitura comprar, em dezembro de 2022, 500 vagas para alunos da rede municipal estudarem no antigo colégio particular Liceu Coração de Jesus, no centro da capital paulista, que pertence à rede de escolas salesianas. Desde então, o espaço se tornou uma unidade da Rede Municipal de Educação, administrado pela Prefeitura de São Paulo, em parceria com uma Organização Social.
Segundo a Secretaria Municipal de Educação (SME), a unidade teve uma nota acima da média da cidade na Prova São Paulo, aplicada pela prefeitura para medir o aprendizado das escolas municipais.
Críticas
O anúncio da privatização da gestão das escolas vem, há meses, acompanhado de críticas da comunidade escolar. Letícia Grisólio, dirigente do Sindicato dos Especialistas de Educação do Ensino Público Municipal de São Paulo (Sinesp), classificou o modelo como um “grande erro” e “ilegal”.
Em suas palavras, a destinação de recursos públicos para a privação de unidades educacionais configura “a fuga da obrigação constitucional de cuidar da gestão direta das escolas de Ensino Fundamental, com a transferência da responsabilidade sobre a política pública de educação para a gestão privada”.
“A legislação brasileira é clara: verba pública é para a educação pública. Não pode ser transferida a entes privados, nem que sejam disfarçados de gestores de escolas públicas. Gestores privados são empresas privadas”, diz. A medida “contraria ainda o princípio constitucional do concurso público e prejudica a carreira do magistério”.
Sara Santana, coordenadora do Comitê São Paulo da Campanha Nacional Pelo Direito à Educação, também criticou, ao Brasil de Fato, a medida. A educadora afirma que a concessão é uma espécie de atestado de “fracasso” da prefeitura na promoção do ensino público de qualidade. “A gente começa a perceber que não há mais vergonha em assumir o fracasso da gestão, porque um gestor da maior cidade do país, da maior economia, entregar as escolas à iniciativa privada é a declaração do fracasso como gestor público”, critica.
Santana defende que a Secretaria de Educação tem condições para melhorar a gestão das escolas, valorizar os servidores públicos e garantir a estrutura necessária para os estudantes. No entanto, ao contrário, “o prefeito está dando legitimidade ao argumento de que o fracasso da escola pública é um problema de gestão do servidor público que está na ponta, e não dele enquanto gestor do poder público e da pasta Secretaria de Educação”.
De acordo com a Constituição Federal, os municípios são responsáveis prioritariamente pelo ensino fundamental e a educação infantil. Sobre o financiamento, os municípios devem aplicar, anualmente, no mínimo, 25% da receita resultante de impostos para a manutenção e o desenvolvimento do ensino e a remuneração dos profissionais.
Em outro trecho, a carta magna determina que os recursos públicos podem ser destinados a escolas comunitárias, confessionais ou filantrópicas que comprovem a finalidade não-lucrativa e apliquem seus excedentes financeiros à educação. A Constituição Federal, de forma geral, no entanto, não dá a possibilidade de conceder à iniciativa privada a gestão ou administração das escolas públicas municipais no sentido de transferir a responsabilidade direta pela operação e direção das unidades educacionais.
O Brasil de Fato solicitou um posicionamento para a Prefeitura. O texto será atualizado quando houver um retorno.
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