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CPI das Bets encerra trabalhos com rejeição de parecer final; ‘Não terminará em pizza’, diz relatora

   
CPI das Bets encerra trabalhos com rejeição de parecer final; ‘Não terminará em pizza’, diz relatora Soraya Thronicke
   

A Comissão Parlamentar de Inquérito (CPI) das Bets encerrou os trabalhos nesta quinta-feira (12), no Senado, com a rejeição do parecer final da relatora, Soraya Thronicke (Podemos-MS). O texto foi derrotado por um placar de quatro votos contrários e três favoráveis. Com isso, o colegiado finaliza os trabalhos sem a adoção de um texto formal que represente institucionalmente as conclusões da CPI sobre o assunto. Apesar disso, logo após o resultado, Thronicke disse à imprensa que pretende encaminhar o documento às autoridades para que as acusações trazidas à tona pelo relatório sejam apuradas.

 

“É vergonhoso, mas não para o Senado Federal, e sim em relação ao problema que nós estamos enfrentando [com as bets]. No entanto, isso não me impede de levar o relatório para todas as autoridades. Se fosse esse o problema, eles [os opositores] estariam salvaguardados, mas caíram do cavalo mais uma vez porque eu farei a entrega do relatório e de toda a documentação que nós correlacionamos para as autoridades competentes para elas continuarem a investigação, indiciarem [os envolvidos] e depois apresentarem ao Judiciário”, disse a senadora.

CPI das Bets encerra trabalhos com rejeição de parecer final; ‘Não terminará em pizza’, diz relatora Soraya Thronicke

 

A parlamentar informou que pretende encaminhar o documento para as cúpulas da Presidência da República; da Polícia Federal (PF); do Ministério Público Federal (MPF); do Supremo Tribunal Federal (STF); do Ministério da Justiça, incluindo a Secretaria Nacional do Consumidor, vinculada à pasta; e do Ministério da Fazenda, englobando ainda a Secretaria de Prêmios e Apostas, órgão situado no guarda-chuva administrativo do ministério.

Ao final das discussões da CPI, votaram pela rejeição do relatório os senadores Eduardo Gomes (PL-TO), Angelo Coronel (PSD-BA), Dorinha Seabra (União-TO) e Efraim Filho (União-PB), enquanto as posições favoráveis vieram dos senadores Alessandro Vieira (MDB-SE) e Eduardo Girão (Novo-CE), além da própria relatora.

O relatório

O parecer final de Soraya Thronicke foi apresentado na última terça (10) e pedia o indiciamento de 16 pessoas, entre empresários e influencers, englobando entre estes os nomes de Virgínia Fonseca, Deolane Bezerra e Pamela Drudi. O texto da relatora aponta uma série de possíveis crimes na conduta dos investigados em sua relação com as bets, como estelionato, lavagem de dinheiro e sonegação fiscal.

O documento propõe o que Thronicke chama de “20 medidas para um necessário freio de arrumação” nos problemas gerados pelas bets. O rol sugere, por exemplo, veto à exploração de cassinos online; à concessão de incentivos fiscais para casas de apostas; à oferta de promoções, recompensas ou programas de fidelidade por parte do mercado de apostas; e ao engajamento de inscritos no CadÚnico no sistema das bets.

O parecer destaca que 40% dos jogadores de apostas de quota fixa, por exemplo, pertencem às classes D e E, enquanto 45% são ligados à classe C e somente 16% se situam nos estratos sociais A e B. “Considerando a distribuição de renda da população brasileira em geral, temos uma sobrerrepresentação da parcela mais pobre no número de jogadores”, afirma Thronicke no documento.

“É dever do Estado, ao mesmo tempo em que regula uma atividade econômica, zelar para que ela não se torne um vetor de agravamento das desigualdades sociais e de endividamento familiar”, acrescenta a relatora, ao mencionar a captura do orçamento de pessoas vulneráveis por parte do mercado de apostas. A senadora afirma ainda que a sugestão incluída no relatório está em sintonia com acenos dados pelo STF. “Em uma decisão liminar histórica proferida em novembro de 2024, o ministro Luiz Fux determinou que o governo federal adotasse medidas imediatas para impedir que os recursos de programas como o Bolsa Família e o BPC [Benefício de Prestação Continuada] fossem utilizados em apostas online”, continua a parlamentar.

O rol de medidas propostas no relatório traz ainda outros pontos, como: limitação do tempo de funcionamento de cassinos online; criminalização da publicidade predatória de apostas; criação de tipo penal para a exploração de apostas por parte de operador não autorizado; criação de tipo penal para pagamentos a agentes não autorizados; alteração da Lei nº 14.790/2023 para tornar expresso no texto que a saúde pública é mais importante que interesses econômicos; criação do Fundo de Combate a Plataformas Ilegais de Apostas; e transparência para controle de tempo e de perdas.

A relatora propôs também que a Anatel passasse a ter poderes para bloquear plataformas ilegais de apostas e que fosse proibida, no Brasil, a chamada “cláusula da desgraça alheia” em contratos de publicidade com plataformas de apostas. Adotado em algumas frentes pelo mercado, esse mecanismo garante a influenciadores digitais uma espécie de comissão baseada nas perdas financeiras de seguidores de sites de apostas.

Números

O parecer de Thronicke traz uma série de dados relacionados à dinâmica do mercado de apostas e aos seus impactos multilaterais. O texto destaca, por exemplo, que o segmento movimentou entre R$ 89 bilhões e R$ 129 bilhões no ano passado e cresceu 1.300% no intervalo de 2018 a 2023. “A partir da última Pesquisa sobre Orçamento Familiar (POF), a consultoria Strategy& estimou que os gastos em apostas representavam 0,73% do orçamento familiar em 2023. Em 2018, quando houve a legalização das loterias de quota fixa, representavam apenas 0,22%. Logo, houve uma alta de 236%”, diz o relatório rejeitado pela CPI.

O documento menciona uma série de outros levantamentos, entre eles pesquisa feita pelo instituto Opinion Box em parceria com o Serasa que ouviu mais de 4.400 consumidores com idade acima de 18 anos em situação de inadimplência. Feito em outubro do ano passado, o estudo mostrou que 13% dos entrevistados declararam já ter deixado de pagar contas para fazer apostas. “Esse dado é reforçado pela pesquisa da Confederação Nacional do Comércio de Bens, Serviços e Turismo (CNC), que revelou que 1,8 milhão de brasileiros se tornaram inadimplentes ao comprometerem a renda com as apostas online”, emenda Soraya Thronicke.

Como consequências do “boom” vivido pelas bets, a senadora menciona ainda outros dados, como uma pesquisa da Universidade de São Paulo (USP) que estimou em 2 milhões o contingente de brasileiros hoje viciados em jogos e apostas, a chamada “ludopatia”. Também destaca que dados do Ministério da Saúde acompanham a tendência: o número de registros de atendimentos de pessoas com sintomas ligados à ludopatia saltou 53% entre 2022 e 2023, segundo o relatório apreciado pela CPI.

“Todos esses números, apesar de chocantes, ainda estão subnotificados”, disse a relatora após a sessão de votação. Soraya defendeu que o país deveria “regulamentar e tributar as bets com mais severidade”.

Opositores

O relatório recebeu críticas de alguns parlamentares, entre eles o senador Eduardo Gomes, para quem os indiciamentos deveriam ser retirados do documento para evitar o que chamou de “xerifes” nas comissões parlamentares de inquérito do Congresso Nacional. “Entendo que a Casa, o Congresso Nacional está passando da hora de rever o papel das CPIs. O destino de xerife de CPI tem sido o desencontro com a opinião pública e com o respeito do eleitor”, disse Gomes,  ao demonstrar incômodo com as denúncias trazidas no relatório de Thronicke. “Eu jamais terei uma bet, mas quem tem bet tem que ser respeitado, até que seja provado que é ladrão ou que não é”, emenda o senador, que divergiu em diferentes momentos ao longo da sessão.

Senador Eduardo Gomes esteve entre os quatro parlamentares que votaram contra o relatório | Geraldo Magela/Agência Senado
 

Soraya Thronicke disse à imprensa que já esperava a derrota do relatório por conta da postura manifestada pelos opositores ao longo da CPI. “Além disso, durante todo esse período eu tive poder de polícia e tive contato com provas robustas, muito robustas, que evidenciam que nos mostram um caminho de que, sim, [há] crimes. E eu não posso me furtar dessa obrigação [de denunciar]. Seria uma omissão eu recolher tudo o que foi feito durante esse período e engavetar. Eu sei, e outros senadores todos sabem, das questões que foram levantadas durante o período da CPI. Então, eu saio feliz, com a missão cumprida, e todos os brasileiros saberão que não terminou e não terminará em pizza. Eu não sou a pizzaiola. O Brasil sabe o voto de cada um.”

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