

De acordo com pesquisa da Firjan, o RJ, com destaque para a capital, contribui para reforçar valores e estilos de vida brasileiros internacionalmente, influenciando desejos Seja pela vista da Lagoa, na Zona Sul, seja pela representação da estética do subúrbio, nas cenas que retratam o bairro de Vila Isabel, na Zona Norte, com seus bares e praças, o remake de “Vale tudo”, da TV Globo, por exemplo, dissemina o imaginário carioca diariamente. Mais do que vender a imagem do Rio para outras cidades brasileiras, a indústria criativa do estado, com destaque para a da capital, ganha protagonismo na projeção da identidade do Brasil para o mundo. É o que revela o Mapeamento da Indústria Criativa 2025, pesquisa da Federação das Indústrias do Estado do Rio de Janeiro (Firjan), divulgada na quarta-feira (18). De acordo com o estudo, o Rio contribui para reforçar valores e estilos de vida brasileiros internacionalmente, influenciando desejos — é o chamado soft power.
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O conceito foi desenvolvido no fim dos anos 1980 pelo cientista político americano Joseph Nye. Ele defendeu a tese de que é possível influir e projetar uma boa imagem de uma cidade ou do país por meio de sua cultura. No caso do Rio — cuja preocupação em ser vitrine é antiga, mas que tem investido ainda mais nesse movimento atualmente, num esforço para fazer frente à imagem de cidade violenta —, esse poder de influência se deve, sobretudo, à potência do audiovisual e à indústria de eventos, aponta o levantamento.
Maria de Fátima (Bella Campos), Solange (Alice Wegmann) e Raquel (Taís Araujo) em cena em praia carioca
Fábio Rocha/Rede Globo
— Estamos sempre lidando com a questão da brasilidade. Eu faço a criação das aberturas de novelas e séries. Participei do processo criativo da abertura de “Vale tudo”, que conta com mais de 150 imagens que tentam construir um retrato do que entendemos de Brasil. Inclusive, recentemente, houve um painel em Cannes, na França, em que exibiram o material, justamente para falar de brasilidade — diz Julia Rocha, diretora de arte da TV Globo.
Força do audiovisual
Segundo a pesquisa, 2,7% das empresas empregadoras no estado são do segmento criativo, percentual maior que a média nacional (2,3%). Em números absolutos, o estado registrou cerca de oito mil estabelecimentos criativos empregadores em 2023, o terceiro maior número do Brasil — um crescimento de 2,8% em comparação com o ano anterior, período analisado pelo estudo. O setor emprega 124 mil trabalhadores, o segundo maior número do país, atrás apenas de São Paulo, que tem 517 mil. Cerca de 75% desse total se concentram na capital fluminense. Já o crescimento dos empregos criativos no estado (6,5%) superou o ritmo nacional (6,1%).
Em cena. A obra de expansão do Polo Rio Cine e Video, na Barra da Tijuca, que está ganhando cinco novos estúdios: espaço criado pela prefeitura para a produção cinematográfica e audiovisual
Leo Martins
Gerente de Ambientes de Inovação da Firjan e coordenadora da pesquisa, Julia Zardo avalia que o crescimento da indústria criativa carioca se relaciona com a exportação do que chama de “marca brasileira”. Dentro da indústria criativa do Rio, analisa, um dos segmentos que mais exercem influência na imagem que o exterior cria do país é o audiovisual.
— Somos uma potência do audiovisual. A cidade tem um grande número de filmagens para cinema, com Marechal Hermes, na Zona Norte, entre os destaques. Nesse contexto, uma produção internacional que tenha gravações aqui pode levar o Rio como protagonista desse produto audiovisual. O próprio Oscar de “Ainda estou aqui” (melhor filme internacional, com uma história que se passa no Rio nos anos 1970) tem feito muitas produções estrangeiras olharem para a cidade como possibilidade de território para gravar — observa.
Uma beleza de cenário
Segundo dados mais recentes da Rio Film Comission, órgão da prefeitura que presta apoio a produtoras, a capital registrou, em um ano, 7.885 diárias de filmagens, superando Paris, com 7.400, e São Paulo, com 4.895.
E existem outros exemplos na capital que ilustram a tendência de crescimento do setor. Em obras há dois anos, o Polo Cine e Vídeo, na Barra Olímpica, deve duplicar sua área construída, oferecida como locação para filmagens, com equipamentos mais modernos e cinco novos estúdios. Desse total, três já foram erguidos e se somaram aos quatro já existentes, que foram reformados. Entre as produções que usaram o espaço está a sequência do filme “O auto da compadecida”, que levou mais de quatro milhões aos cinemas.
Casa do filme “Ainda estou aqui”, na Urca
Gabriel de Paiva
— Os talentos artísticos e os técnicos mais experientes se concentram no Rio. Depois dos Estúdios Globo, somos o maior do país. O setor audiovisual está em transição e a tendência é de expansão desse mercado — diz Marcelo Pedrazzi, da produtora Quanta, concessionária que administra o Polo Cine e Vídeo.
Os megaeventos, como o réveillon e grandes shows, a exemplo da recente apresentação de Lady Gaga na Praia de Copacabana, ajudam a fazer do Rio uma vitrine do país para o exterior, o que atrai cada vez mais turistas e movimenta a economia do estado.
— Diferentes gêneros musicais, como o funk, o charme, o rap e ainda a bossa nova, continuam como uma referência de exportação da nossa cultura, com participação crescente dos DJs, além do calendário permanente de grandes eventos, como o Rock in Rio, levando o nome da cidade para fora, o carnaval e a própria Bienal do Livro. Em um ano, as atividades da indústria de eventos cresceram 40% — destaca Julia Zardo.
Por falar em carnaval, a folia é um dos eventos que mais atraem os olhares do mundo para o país, despertando o interesse de turistas e gerando efeitos na economia. Este ano, na capital, a festa movimentou R$ 5,5 bilhões em serviços prestados, principalmente, por hotéis, bares e restaurantes.
— No auge dos preparativos do desfile deste ano, chegamos a ter cerca de 300 pessoas trabalhando. O nível da festa tem crescido sempre, exigindo reforçar as equipes, inclusive com trabalhadores temporários. Isso representa um aumento de 30% do pessoal em cerca de dez anos — diz Almir Reis, presidente da Beija-Flor, atual campeã do carnaval.
Influência nas redes
A Firjan apontou também a importância dos influenciadores digitais, um filão em crescimento, para a divulgação da imagem da cidade, a ponto de a Secretaria municipal de Turismo certificar com um selo, o Rio Digital Influencer, os que se destacam nessa tarefa.
— Minha atuação vai além das redes sociais. Ela é parte ativa do movimento que impulsiona a economia local e posiciona o Rio como uma cidade vibrante, criativa e cheia de oportunidades. Meu conteúdo não apenas conecta pessoas, mas inspira o consumo consciente e o que é produzido aqui — afirma Vanessa Ramos (@girodacarioca), uma das influenciadoras certificadas pela prefeitura.
No balcão. Anderson Drummond, sócio da Vahalla Burguer, que vende hambúrgueres e chope artesanais: 60 empregos
Guito Moreto
O estudo analisou 13 segmentos da indústria criativa, separados em quatro grandes áreas: Consumo, Mídia, Cultura e Tecnologia. Tecnologia (45%) e Consumo (39,8%) são as áreas que mais empregam na economia criativa fluminense. Porém, ao se considerar o crescimento de postos de trabalhos criativos de 2022 para 2023, o ranking foi liderado pelo avanço de vagas na área da Cultura (9,4%).
— Dentro de Cultura, uma das áreas que mais cresceram foi a gastronomia. As pessoas começaram a querer voltar para a rua a fim de conviver, e isso movimentou a geração de empregos nesse setor — avalia a coordenadora da pesquisa.
O setor tem visto também o surgimento de novos empreendedores. É o caso de Anderson Drumond, sócio da Valhalla Burguer, com lojas na Tijuca, no Méier e em Jacarepaguá e planos de expandir para a Zona Sul. Boa parte dos alimentos consumidos na rede vem de produtores artesanais, incluindo a cerveja, o chope e o hidromel.
— Entre fornecedores e pessoal próprio, a cadeia produtiva emprega cerca de 60 pessoas. E é uma mão de obra especializada, que exige treinamento e qualificação — diz Drumond.
Outro exemplo é Diva Oliveira, de Vila Isabel, dona de uma confeitaria artesanal, que, em parceria com os hotéis da rede Othon, ministra aulas on-line e forma cozinheiros especializados na gastronomia preta. A iniciativa já formou 48 pessoas.
— Ofereço alguns doces à base de ingredientes diferentes, como um bolo de frutas cítricas com sementes de papoula. E outro com capim-limão, que é mais encontrado em chás — conta.